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Sociedade debate programa família acolhedora em MT

Sociedade debate programa família acolhedora em MT

Com o objetivo de debater a implantação do programa Família Acolhedora em Mato Grosso, o Poder Judiciário Estadual promoveu uma audiência pública nesta sexta-feira (26 de agosto), das 9h às 13h, no espaço Justiça, Cultura e Arte Desembargador Gervásio Leite, na sede do Tribunal de Justiça. O evento contou com a participação de membros da sociedade civil, integrantes da rede de proteção e de associações, magistrados e servidores públicos. A audiência foi presidida pela corregedora-geral da Justiça e presidente da Comissão Estadual Judiciária de Adoção (Ceja), desembargadora Maria Erotides Kneip, e coordenada pelo juiz auxiliar Luiz Octávio Saboia.
Além da presidente e do coordenador da iniciativa, a mesa de autoridades foi composta pelo secretário de Estado de Trabalho e Assistência Social, Valdiney de Arruda, pela secretária-adjunta de Segurança Pública Marilyn Rondon, pelo promotor de justiça José Antônio Borges, pelo juiz da 1ª Vara Especializada de Violência Contra a Mulher de Cuiabá e presidente do Comitê Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual contra a Criança e o Adolescente, Jamilson Haddad Campos, pelo secretário-adjunto de Assistência Social e Desenvolvimento Humano da capital, César Vidotto, e pela representante do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e da Comissão da Infância e Juventude da OAB-MT, Lindacir Rocha Bernardon.
A audiência foi aberta pela desembargadora corregedora Maria Erotides Kneip, que contou como surgiu a ideia de implantar o serviço de acolhimento familiar no Estado. Segundo ela, quando assumiu a CGJ-MT em fevereiro de 2015 havia quase 900 crianças em instituições de acolhimento e processos de destituição do poder familiar em trâmite há mais de dois anos. “Pensamos então em obter soluções para esse quadro. Fomos em busca de várias iniciativas até descobrirmos o programa família acolhedora”, narrou. Atualmente, cerca de 500 crianças estão acolhidas e a expectativa é que esse número diminua ainda mais nos próximos meses. “Quando sairmos daqui, hoje, espero que tenhamos um compromisso firmado”, propôs a corregedora.
Maria Erotides falou ainda das graves consequências do acolhimento institucional e asseverou: “Colo de mãe é sagrado e não existe colo de mãe em abrigo”. A desembargadora convidou a neta Mariana Kneip Almeida Macedo para ler o relato de um pai acolhedor de São Paulo, que contou a experiência com o pequeno Samuel (leia aqui).
Representando o governador Pedro Taques, o secretário Valdiney de Arruda disse que o Executivo está em contato com a Assembleia Legislativa para regulamentação do serviço, uma vez que já está em andamento um projeto de lei semelhante à família acolhedora. Valdiney destacou a importância do trabalho em rede e afirmou que o governo está disposto a assumir o seu papel. “Sairemos daqui com encaminhamentos importantes dessa prospecção do que precisaremos trabalhar para essa lei estadual, que dará subsídios às leis municipais”, argumentou.
Na sequência, o juiz auxiliar das CGJ-MT Luiz Octávio Saboia apresentou a família acolhedora. O magistrado falou sobre a preocupação da atual gestão com a infância e juventude e revelou que foram instituídos indicadores nessa área, constantemente monitorados pela Auditoria de 1ª Instância do Foro Judicial. “Fazer mais do mesmo significa obter os mesmos resultados. O que queremos é mudar a trajetória de vida fazendo algo diferente”, conclamou.
O juiz falou sobre: princípio constitucional da prioridade absoluta; Lei da 1ª Infância; previsão legal do direito à convivência familiar e comunitária e modalidades de acolhimento segundo o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). De acordo com ele, o conceito de família acolhedora com o qual a CGJ-MT pretende trabalhar é “unidade familiar que voluntariamente tem a função de acolher em seu espaço familiar, pelo tempo que for necessário, a criança e/ou adolescente que, para ser protegido, foi retirado de sua família, oferecendo-lhe todos os cuidados básicos mais afeto, amor, orientação, favorecendo seu desenvolvimento integral e sua inserção familiar, assegurando-lhe a convivência familiar e comunitária”.
O magistrado ponderou que a família acolhedora não deve ser um atalho para a adoção e que casos como esse devem ser a exceção. “Devemos buscar sempre o melhor interesse da criança e do adolescente”, disse. Ele pontuou ainda os objetivos específicos do serviço:
– Propiciar o acolhimento em ambiente familiar, garantindo atenção individualizada e convivência comunitária, permitindo a continuidade da socialização da criança/adolescente;
– Reduzir o tratamento padronizado, que atualmente é dispensado nas unidades de acolhimento de crianças e adolescentes, proporcionando cuidados individualizados em ambiente familiar;
– Garantir a crianças e adolescentes a convivência familiar e o acesso à rede de políticas públicas, ainda que através da medida de proteção;
– Contribuir para que crianças e adolescentes tenham seus direitos garantidos;
– Preservar vínculos com a família de origem, salvo determinação judicial em contrário;
– Apoiar, quando possível e viável, o retorno da criança e do adolescente à família de origem, reduzindo as violações dos direitos socioassistenciais, seus agravamentos ou reincidência;
– Desinstitucionalizar crianças e adolescentes.
E para fechar, relacionou as vantagens da iniciativa, que: oferece espaço familiar; mantém a criança na comunidade; proporciona o desenvolvimento de relações estreitas com a família de acolhimento; possibilita à criança continuar vinculada e identificada com a família biológica; pode haver a inclusão da família biológica na proteção da criança; pode oferecer apoio na transição para a vida adulta.
O debate teve início após a apresentação. O promotor José Antônio Borges disse que o modelo da família acolhedora é interessante e tem a função de evitar o acolhimento institucional. Contudo, ele vê como dificuldade o fato da família ser de passagem e não poder adotar. “Tenho uma certa resistência à iniciativa. Meu medo é: como deixar uma criança durante aproximadamente dois anos em uma família e depois transferir para outra?”, questionou. O juiz Jamilson Haddad destacou a responsabilidade humana que o programa representa e afirmou que certamente contribuirá para a redução dos índices de violência contra esse público.
Lindacir Bernardon se mostrou contrária à opinião do promotor e argumentou que a adoção deve ser uma possibilidade e não a regra do programa. Segundo ela, essa modalidade de acolhimento inclusive prepara as crianças para a adoção. “Acredito que teremos menos devoluções das famílias adotivas se as crianças forem preparadas pelas famílias acolhedoras”, considerou. O conselheiro tutelar de Matupá (a 695 km de Cuiabá) Carlos André Alves também colocou o município como parceiro e contou que o projeto de lei da família acolhedora está em andamento no município. “É uma oportunidade da sociedade se envolver cm os problemas sociais relativos à criança e ao adolescente”, opinou.
A assistente social Denise Pereira de Araújo Campos, da Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara), colocou a entidade à disposição para implantação da modalidade de acolhimento familiar em Mato Grosso e falou da diferença em relação à adoção. “Ambas oferecem a proteção integral em ambiente familiar e comunitário, sendo que na adoção a transferência dos direitos parentais é total e irrevogável: a criança e o adolescente assumem a condição de filho. Há a substituição dos direitos, das obrigações e a identidade legal pode ser alterada. No acolhimento familiar a transferência dos deveres e direitos da família de origem para outro adulto ou família é temporária. Não há substituição, há parceria e colaboração”, relatou.
A audiência contou ainda com a participação de magistrados e cidadãos de Juara, Chapada dos Guimarães, Poxoréu, Alta Floresta e Mirassol D’Oeste. A sessão foi transmitida em tempo real para todo o Estado. No encerramento, Luiz Octávio Saboia observou que primeiro grande desafio quando se fala em acolhimento familiar é mudança de cultura. E a corregedora Maria Erotides deixou uma reflexão: “A família que exigir a adoção para acolher não é a família ideal para o programa, porque o amor é incondicional, ele deixa ir. Você cria um filho para ficar com você o resto da vida ou o prepara para o mundo?”, questionou.
A apresentação do magistrado Luiz Octávio Saboia está disponível na íntegra, aqui.
Ana Luíza Anache | Fotos: Chico Ferreira (Agência F5)
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